Regulamentar a mídia não é censurar

         



           As pessoas criam uma confusão. Aí a velha mídia nativa (sic) ajuda a criar mais confusão ainda a respeito da regulamentação da mídia. E as pessoas que não tentam se informar vão pensando cada vez mais que regulamentar é censurar.
            Os grandes grupos de informação do Brasil cresceram graças aos golpes contra a democracia. Foi recente. As organizações Globo ainda não tinham essa TV aberta, esses canais a cabo, essas rádios, essas revistas e esses jornais que criminalizam os movimentos sociais diariamente. A Folha não tinha esse poderio todo. O Estadão não governava São Paulo naquela época ainda. A Veja não despejava esse fascismo institucionalizado. Mas hoje é o que há. Seis famílias são donas de 80% da circulação e informações midiáticas no Brasil graças ao regime militar. Se não fosse a internet e os meios impressos alternativos, essa crítica nem ia ser lida por cinco pessoas.
            Regulamentar a mídia é seguir o belo exemplo de Cristina Kirchner, presidenta da Argentina. É acabar com os monopólios que dominam a opinião pública, sendo que essa se limita ao que pensam esses grandes empresários. Acabando com os monopólios, liberamos espaços para mais concessões de TV e rádio. Nesse caso, poderíamos ter mais rádios comunitárias e que de fato fossem comunitárias, além de TVs universitárias e comunitárias. Imaginem um menino do morro produzindo um programa de TV. Seria bem mais interessante do que ver Carlos Alberto Sardenberg no Jornal da Globo e Míriam Leitão no telejornal Bom dia Brasil receitando que, para o Brasil crescer, tem que elevar os juros e cortar gastos públicos (resumindo: os pobres que se explodam!). A qual Brasil eles se referem? O Brasil das mesmos grandes grupos dos quais eles fazem parte, que sempre empregaram pouco. Como disse Dilma em entrevista recente no exterior, a imprensa quer acabar com a doença matando o doente.
            Por último, regulamentar é atualizar nossa legislação caduca, com os traços podres da ditadura militar. É combater o modus operandi de todo o coronelismo, fisiologismo, oportunismo dessa reação estranha entre o público e o privado, em que o público respeita o privado, mas o privado não respeita o público. Aliás, já faz muito tempo que não existe a esfera pública. Ela é imaginária. Imaginamos que ela existe, em algum lugar. O que vemos é uma estrutura às cegas da privatização da esfera pública com vários donos, entre políticos de todos os partidos querendo defender interesses pessoais e dos amigos da burguesia. Até quando a Globo vai governar o país? Vai dominar uma boa fatia da verba de publicidade oficial? Até quando esses grupos vão criminalizar os movimentos sociais, mostrando claramente por que apoiaram o regime militar? Até quando? Até quando vão esconder as mortes do Araguaia, a operação Condor, a vala de Perus e os restos de Honestino Guimarães? Até quando a Globo vai esconder que contratou militares para censurar intelectuais e artistas que mais se identificassem com a esquerda? Até quando  Folha vai desmentir que emprestava carros para os militares perseguissem militantes da esquerda? Até quando a Veja vai continuar com esse discurso de ódio contra o nordestino, contra a empregada doméstica?

            Até sempre. Não queremos calar a Globo, Veja, Folha e Estadão. Que eles continuem se silenciando diante de algumas questões e falando de outras. Isso é seu direito e até seu dever como veículo de informação parcial e impessoal. Todo veículo de informação é parcial ideologicamente, mas impessoal na produção do texto. Não queremos calá-los. Longe disso. O que queremos é que eles não representem a ampla maioria da circulação de informação do país e sufoquem jornais impressos menores, TVs e rádios alternativos. Expressar-se é um direito, ter concentração dos meios de comunicação não. Concentração é o princípio e toda desigualdade. Portanto, ao tirar deles a concentração, estamos democratizando os espaços. E democratizar é preciso sempre em um Estado democrático de direito recheado de autoritarismo político e midiático. A democracia é um sistema, mas como todos outros, precisamos regar diariamente para garantir-lhe a sobrevivência. 


Por Gabriel Nascimento