Se essa moda pega...

Publicada no Jornal Diário de Ilhéus em 24 de Fevereiro de 2010
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Um projeto que pode dar o que falar foi lançado no congresso pelo senador Cristovam Buarque e versa sobre a obrigatoriedade dos gestores públicos eleitos em matricularem seus filhos na escola pública. Sim! O senador deve ter se baseado na premissa de que se os políticos forem obrigados a matricular seus filhos na escola pública ( e não na particular) eles terão que se importar muito mais com o funcionamento do ensino público no país. A proposta é válida, porém deve ser analisada de diversas formas.


Em primeiro lugar é preciso analisar que as políticas de educação pública e gratuita no país são novas. A abolição da escravatura, na década de 80 do século XIX significou muito pouco avanço real na democratização e desenvolvimento de mão-de-obra qualificada em nossa história. A Princesa Izabel não deu documentos e nem alfabetizou os negros, apenas jogou cada um deles, de qualquer jeito na mão dos latifundiários nordestinos (já que com os italianos ganhando espaço no Sudeste e Sul do país aconteceu um tráfico interno de mão de obra do Sudeste e Sul pro Nordeste), desenvolvendo a mão de obra mais barata das primeiras décadas do século XX. Enquanto a primeira Universidade na Argentina foi fundada no século XVII o Brasil ainda cambaleava academicamente. Cabe dizer que durante muito tempo a dita Universidade Pública só era acessada pelos filhos da alta elite brasileira e herdeiros do alto coronelado. Ainda na década de 70 a escritora Clarice Lispector fazia um protesto escrito a esse respeito. E a democratização da escola básica pública inexistiu durante muito tempo. Tal democratização nasce depois de acordos e convenções internacionais que abarcaram o tema educação gratuita (cite-se a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1948).

Perceber a importância desse projeto, a partir de fatos históricos, traz à tona uma série de outros argumentos. É necessário reconhecer os avanços do Governo Lula nesse sentido, citando o Piso Salarial dos Professores da Educação Básica, uma política de baixo custo de eletroeletrônicos impulsionado por incentivos fiscais e tributários, uma distribuição de computadores por toda a rede pública de ensino do país, incentivos à educação superior, entre outros. Entretanto, somente isso não basta. Se tal aprovação acontecesse (o que é inverossímil) nossos bons políticos iam ter que começar a se preocupar com o funcionamento desse negócio tão esquecido chamado educação básica, e iam ter que começar a “colar” o exemplo da Coreia do Sul, que em algumas décadas saiu do vermelho investindo na educação básica... Imagine a cena de um ilustre senador falando ao Plenário que o filho dele, que é disléxico, não está recebendo aulas satisfatórias, e por isso é imprescindível que os colegas (os colegas dele, os outros senadores) aprovem mudanças rápidas para a qualificação e valorização de professores no país. Por enquanto isso fica só na imaginação. E os casos de dislalia, dislexia, disgrafia, disfalia, entre outros milhares conhecidos dos psicólogos, fonoaufiólogos, linguistas e muitos outros profissionais, ficam no esquecimento ou são tratados como “treita” desses alunos pobretões e “moda” desses professores incompetentes.

São sonhos acreditar em algumas dessas inúmeras possibilidades quando a política brasileira, com uma democracia tão nova também, é interpretada aos modos do jus utendi et obtendi (do latim “Direito de usar e abusar”).

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Por Gabriel Nascimento